Cerca de três mil servidores públicos têm seus salários retidos para pagamento de empréstimos que contraíram anos atrás em percentuais altos. Pela lei aprovada na CLDF, o banco só pode descontar 40% do salário líquido do trabalhador
Correio Braziliense – Parlamentares do Distrito Federal têm reclamado da gestão do Banco de Brasília (BRB) no trato com servidores públicos da capital do país, em relação à cobrança de empréstimos e linhas de créditos concedidas. Segundo informações da Câmara Legislativa e de servidores de diversos setores, desde abril, o banco público tem desrespeitado a Lei 7239/2023, aprovada com o voto de 21 dos 24 deputados distritais.
Em maio, entrou em vigor a legislação que determina que, dos empréstimos e créditos concedidos para servidores do Governo do Distrito Federal (GDF) e da Câmara Legislativa pelo BRB, só podem ser descontados das contas desses funcionários públicos o limite de 40% do salário líquido.
Esse parâmetro é definido com base em legislação já em vigor que estabelece 30% para os servidores pagos pelo GDF e 35% dos que têm a folha bancada pela União, caso dos servidores das forças de segurança. Esses limites são acrescidos de mais 5% das dívidas do cartão de crédito.
Mas a legislação não tem sido cumprida em muitos dos casos. A lei, que partiu de projeto de autoria do deputado distrital Roosevelt Vilela (PL), teve trechos vetados pelo governador Ibaneis Rocha (MDB), mas os vetos foram rejeitados pela Câmara Legislativa e a lei entrou em vigor da forma como aprovada pelos parlamentares. O veto de Ibaneis Rocha foi derrubado com 21 votos contrários e três ausências.
Com a derrubada, as instituições financeiras que oferecem crédito no Distrito Federal deverão “se guiar pelo princípio do crédito responsável, analisando, no conhecimento técnico que lhes é próprio, a condição de solvabilidade de cada devedor no momento da concessão, a fim de que não haja comprometimento ao mínimo existencial, nos termos do art. 6º, XI e XII, do Código de Defesa do Consumidor, Lei Federal nº 8.078, de 11 de setembro de 1990”.
Milhares prejudicados
Segundo o deputado Roosevelt Vilela, há 35 mil servidores superendividados no DF e 3,5 mil que entregam o salário integral para pagar as parcelas das dívidas. O desconto é compulsório. “Essa é uma situação de calamidade pública. Imagina o servidor trabalhar o mês inteiro para pagar dívidas e não receber nenhum centavo”, questiona o distrital.
Esses servidores não conseguem mais ter dinheiro para arcar com as contas e pagamentos durante o restante do mês.
Antes da votação da derrubada do veto, vários distritais foram à tribuna em defesa dos servidores endividados e com críticas à atuação do BRB. Roosevelt Vilela destacou, à época, que a proposta visava a “acabar com o sistema predatório do BRB”.
O distrital do PL diz que já manteve contatos com o BRB e foi feito um compromisso de que a cobrança das parcelas das dívidas seriam limitadas a 40% e o prazo de pagamento seria ampliado. “Assim não tem calote no banco, mas os servidores podem respirar, mas o BRB prometeu e não entregou”, afirma Roosevelt.
O governo do Distrito Federal impetrou uma ação direta de inconstitucionalidade (Adi) com pedido de liminar para tentar suspender os efeitos da lei, sob o fundamento de que há invasão da competência federal. Mas Roosevelt defende que se trata de matéria da competência do direito do consumidor que pode ser tratado pela Câmara Legislativa, segundo entendimentos do TJDFT. Esse caso, no entanto, ainda não foi julgado.
Inaceitável
Para o deputado distrital Fábio Felix (PSol), é inaceitável que regras nacionais que todos os bancos praticam não sejam respeitadas pelo BRB. Na votação, Félix disse acreditar que a lei faria justiça aos correntistas do BRB e acabaria com as práticas abusivas.
Um dos parlamentares preocupados com o tema é o deputado Chico Vigilante (PT), que há anos defende a adoção de medidas que venham a ajudar essas pessoas, chamadas por ele de “superendividados”. O petista já promoveu várias audiências públicas na Casa para debater o tema. Vigilante acha que a questão precisa ser debatida com todos os setores envolvidos, de forma a ajudar os servidores que estão nesta situação.
O deputado defende que, da mesma forma que o governo recria programas para recuperação de empresas, como o Refis, e créditos especiais para empresários, precisa ser feita alguma iniciativa voltada para o caso específico destes servidores, para que eles não trabalhem e fiquem, sempre, sem condições mínimas que lhes permitam viver o restante do mês.
O argumento de muitos deputados que defendem a regra em vigor desde abril passado é de que a lei não estabelece uma moratória geral, apenas um percentual máximo a ser descontado desses credores. Mesmo assim, denúncias feitas por servidores são de que o banco continua descumprindo tal legislação.
O Correio entrou em contato com a assessoria de imprensa do BRB, mas até o fechamento desta edição, não obteve retorno.